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2021-05-28
Tito Rendas explica como proteger os segredos comerciais

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Segredos comerciais: uma via de proteção alternativa dos ativos imateriais das empresas | Tito RendasCoordenador da área de Propriedade Intelectual da CCA

São várias as empresas cujo sucesso assenta no facto de guardarem a sete chaves informação de elevado valor comercial. Talvez o mais célebre e bem-sucedido segredo de negócio da história seja a fórmula da Coca-Cola – um segredo que vale à multinacional americana somas avultadas em vendas aos consumidores. Enquanto instrumentos de gestão e promoção da competitividade empresarial, os segredos comerciais têm sido de grande utilidade também para empresas do setor tecnológico. O exemplo paradigmático é o da Google, que mantém em confidencialidade parte do funcionamento do PageRank – o algoritmo utilizado para determinar a posição de websites nas listas de resultados produzidas pelo seu motor de busca.

O segredo comercial, como qualquer outro segredo, é informação. E é informação que, para ser juridicamente protegida, não tem de integrar qualquer categoria específica. Não tem de ser uma “invenção técnica”, como exige o direito de patentes, nem tem de ser uma “obra literária ou artística”, como impõe o direito de autor. A proteção dos segredos comerciais pode, pois, abranger ativos intangíveis tão diversos quanto listas de fornecedores e clientes, métodos de produção, estudos de mercado, estratégias de vendas ou datas de lançamento de produtos.

A proteção de inovações tecnológicas pela via dos segredos de negócio tem óbvias vantagens. Desde logo, a tutela dos segredos, ao contrário da conferida pelas patentes, não está sujeita a qualquer limite temporal. Desde que a informação permaneça confidencial, a proteção jurídica pode prolongar-se indefinidamente. E, da perspetiva de empresas como as start-ups, há uma outra vantagem não negligenciável: a de que o segredo permite um acesso instantâneo e praticamente gratuito à proteção, que não está dependente de pedidos de registo e do pagamento das respetivas taxas oficiais.

Não seria surpreendente que o recurso ao segredo como meio de proteção de inovações tecnológicas viesse a aumentar, em resultado, por um lado, do acréscimo na atenção mediática dada a litígios envolvendo empresas como a Uber, a Huawei ou a Apple e, por outro, das recentes alterações legislativas nesta matéria. Entre essas alterações conta-se a transposição, para o ordenamento jurídico português, da Diretiva da UE sobre segredos comerciais. Uma das preocupações fundamentais da Diretiva – e do Código da Propriedade Industrial de 2018, que a transpôs – foi o reforço da tutela dos segredos comerciais, com a consagração de um vasto catálogo de medidas de prevenção e reação contra a violação dos mesmos, onde se incluem medidas cautelares, inibitórias e indemnizatórias.

As empresas interessadas em beneficiar destes mecanismos de tutela devem começar por fazer o levantamento das informações capazes de preencher os três requisitos de proteção previstos na lei: (i) serem secretas, no sentido de não serem geralmente conhecidas pelas pessoas dos círculos que lidam normalmente com o tipo de informações em questão ou facilmente acessíveis a essas pessoas; (ii) terem valor comercial resultante do secretismo; e (iii) terem sido objeto de diligências razoáveis para manter o secretismo.

Em especial, as empresas devem certificar-se de que adotaram medidas de proteção adequadas, como a celebração de acordos de confidencialidade com colaboradores e parceiros, a instalação de sistemas de videovigilância, a implementação de palavras-chave, a segmentação do acesso à informação empresarial ou a organização de ações de formação internas sobre o tema. E devem ainda conduzir verificações periódicas a essas medidas, garantindo que se mantêm atualizadas em face de desenvolvimentos jurisprudenciais e legislativos.

Naturalmente, a implementação destas medidas de proteção não significa que o segredo seja inviolável. Já dizia o Padre António Vieira que o único segredo perfeito é a ignorância, “porque o segredo que se sabe pode-se dizer; o que se ignora, não se pode manifestar”. Mas o que as empresas não devem ignorar é que o segredo é uma alternativa eficaz e acessível de proteger os resultados dos seus esforços de inovação. Uma utilização planeada e informada desta via de proteção pode fazer a diferença entre ascender, ou não, ao Olimpo empresarial onde se sentam a Coca-Cola e a Google.